Mitos Demitidos

Saturday, October 30, 2004

Mito do Labirinto vs Mito da Vida

Da necessidade de tentar explicar a minha condição humana e os fenómenos, que regem a minha psicologia, surge a mitologia paradigmaticamente plástica. Neste cenário, acontece a história de Ricardo, um homem criativo, louco por vezes, conhecido por lunático e festeiro q.b . Um dos seus maiores feitos foi o Labirinto mental, construído a pedido da sua dúvida, relativamente ao futuro, com o objectivo de aprisionar a decepção, besta que se alimentava da ansiedade e ambição. Por ter atingido a maioridade na tomada de decisões, e por não perscrutar um caminho claramente delineado, ele foi lançado, juntamente com a sua expontaneadade, no Labirinto. Sabendo que era impossível sair do Labirinto e, vendo-se diante de uma situação crítica, sabia que teria que se superar, planeando e executando a sua fuga. Demonstrando mais uma vez o talento que lhe era devido, teve, então, a idéia de construir asas para que ele e a sua expontaneadade pudessem fugir. Juntando penas de sonhos, amarrou-as com fios de linho e colocou uma camada de memória sob elas, para que não se descolassem. Amarrou as asas na expontaneadade e preparam-se para a grande fuga, provando que o Labirinto, ao invés de ser seu fim, foi apenas uma oportunidade para que provasse sua ilimitada capacidade criativa e de sobrevivência. Antes de partir, porém, advertiu a expontaneadade de que deveriam voar a uma altura média, nem tão próximo do deslumbramento, para que as elevadas expectativas não derretessem a memória, que colava os sonhos, nem tão baixo, que pudessem cair na monotonia mortal. Assim, ele levantou vôo, ainda receoso da vida, e foi seguido pela expontaneadade. Durante o vôo, esta deslumbrou-se, achando poder dominar a vontade, achando poder vencer sózinha. A memória dos sonhos começou rapidamente a derreter, a ilusão tomou lugar, e caiu na monotonia. Quando ele percebeu que a expontaneadade não o acompanhava mais, olhou para baixo e viu os sonhos a flutuar na perdição. Apesar do sofrimento, ele sabia que estava vivo, sabia que os sonhos realmente nunca morrem e sabia que um dia iria desenhar novos sonhos, à imagem dos anteriores, e rumar à felicidade...

Thursday, October 28, 2004

O caso do cantil descurado

O caso do cantil descurado é um caso de extrema recorrência nos filmes hollywoodescos clássicos e menos clássicos.

Imaginemos uma cena passada algures num deserto tórrido, num daqueles dias em que a própria imagem parece distorcida, cambaleando como se o setting estivesse a derreter. Vários indíviduos estão em visível sofrimento e, puxando dos seus cantis como forma a atenuar essa dor, descobrem que não têm uma única gota de água. Que fazem eles perante este facto? Ou melhor, que fariamos nós numa situação semelhante mas real? Eu guardaria o cantil tendo a esperança de vir a encontrar água, ou pelo menos alguem que ma providenciasse. Mas, em qualquer filme que se preze, o cantil é sempre descurado e deitado fora, sem dó nem piedade.

Será que isso faz sentido? Trata-se afinal do quê? De um acreditar na morte iminente ou de uma situação milagrosa que venha em socorro da personagem?

Acreditar no primeiro dos casos quase nunca encaixa no perfil da personagem em questão (geralmente estamos face a heróis ou tipos destemidos) e a probabilidade de algo acontecer que salve a personagem numa situação como esta é tão ínfima que nem o QI mais humilde poderá aviltar.

Por isso a dúvida persiste e a única explicação que encontro é o acentuar o plot e o lado visual do acto. No entanto, não é plausível nem merece aplauso tal explicação.

Mito da Sereia

A sereia influi um conceito interinsecamente associado à sensualidade. O desejo animal do homem pela mulher. Na verdade, uma sereia será sempre uma criatura de seios avantajados e de cabelos longos lisos, que reluzem com a luz (secos e bem tratados, por mais estranho que possa parecer). E isso, de facto, é um estímulo ao sexo contrário. Mas que dizer do restante corpo? Escamas! Será que estas terão algum papel estimulante? Não me parece...não existem as formas que tradicionalmente e de forma naturalmente Pavloviana despertam a libido no animal masculino de caminhar recto. Este para se estimular precisa de pernas nuas e lisas cobertas de uma pele macia e sedosa. Necessita de visualizar um traseiro atractivo, firme. E finalmente dos pelos pubicos, que são tipicos do mamifero, e que ajem de forma afrodisiaca no sistema nervoso complexo do observador. Bem, neste caso, como é que estas criaturas miticas podem ser criaturas sexuais? As respostas podem ser várias. A resposta racional de associar este ensejo humano, derivado da carência de individuos do sexo feminino em alto mar, a um acto de desespero. Isto é, após meses sem ver terra e sem ver uma única mulher não me admira mesmo nada que alguns conseguissem imaginar mulheres emergindo das formas sensuais deixadas pelas ondulações do mar. Ou, então, a resposta poderia ser de cariz romantico e associar o sentimento platónico (com um inexistente acto sexual consumado, pela falta de compatibilidade física) à poesia...ao lirismo do amor...algo de tão vago e de tão pouco esclarecedor...mas de infinita beleza e nobreza.

Tuesday, October 26, 2004

Richard Dawkins

Unweaving the Rainbow:Science, Delusion and the Appetite for Wonder
by Richard Dawkins, 1998

"My title is from Keats, who believed that Newton had destroyed all the poetry of the rainbow by reducing it to the prismatic colors. Keats could hardly have been more wrong, and my aim is to guide all who are tempted by a similar view, towards the opposite conclusion. Science is, or ought to be, the inspiration for great poetry."

Tem piada. Há coisa de uns 3 ou 4 anos atrás fui acusado de anti romantico, insensível e outros adjectivos menos próprios de um ser humano bom e recto. E fui, exactamente por acreditar, sem restrições de qualquer natureza nem tabus romantizados, que a ciência explica qualquer fenómeno orgânico e não orgânico. Que por detrás de qualquer espirro, qualquer devaneio criativo, qualquer sentimento de desejo, de altruismo, de amor puro estão um conjunto de fórmulas dinâmicas de variáveis complexamente desenhadas. Tudo o que nos rodeia, seja o que nos é visível a olho nu, seja o que passa pelo mundo dos sentimentos, é desenhado num mapa de modelos matemáticos. A matemática assassina a poesia do sentimento? Não me parece. E aí partilho do sentimento de Richard Dawkins.

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